A transposição do rio São Francisco

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Sinopse

Este documentário detalha alguns dos benefícios esperados da transposição do rio São Francisco, uma obra gigantesca que vem sendo realizada no Brasil desde o ano de 2007. Esse é um dos maiores rios brasileiros que possui em torno de 2800 quilômetros e atravessa cinco estados brasileiros. O projeto tem como justificativa o abastecimento de regiões que sofrem com a seca no nordeste brasileiro, gerando dessa maneira uma garantia hídrica para a população desses locais. Por ser uma obra gigantesca, ela é dividida em dois eixos principais e vários trechos que visam abastecer rios temporários e açudes que secam durante o período de estiagem em diferentes áreas do nordeste. O documentário revela a situação atual de locais onde os trechos foram finalizados e os benefícios que a água do rio São Francisco trouxe para a população. Vários produtores relatam as melhorias que houveram em suas produções, principalmente os grandes produtores de frutas, que usufruem de um sistema de irrigação avançado e produzem toneladas de frutos para exportação. Por outro lado, é mostrado também a melhoria na vida das pessoas menos favorecidas, que conseguem encontrar na chegada das águas uma esperança para viver nesses locais que antes eram extremamente secos e com condições de vida frequentemente inviáveis. A esperança na chegada da água é o que move a população que ainda não recebeu esse benefício e aguarda ansiosamente por esse momento, como é relatado por várias pessoas durante o documentário.

Vale salientar, que alguns projetos foram desenvolvidos com a finalização dos trechos da transposição, como por exemplo, o projeto Pontal, onde pequenos produtores receberam um sistema de irrigação promovendo a intensificação da agricultura e o assentamento de pessoas que tiveram que se retirar de suas moradias por conta do avanço da obra. É mostrado também um projeto ambiental proposto pelo NEMA, que visa recuperar o impacto ambiental gerado por essa obra gigantesca, por meio do plantio de árvores e vegetação nativa que foram destruídas devido as construções. Basicamente o documentário nos mostra os aspectos positivos que essa obra trouxe, ou trará, para a população beneficiada.

Análise Crítica

           

Esse documentário apresenta numerosos defeitos, sendo o principal deles o forte viés promocional que nos entrega somente o lado positivo desse projeto governamental, omitindo todas as controvérsias que o projeto trouxe ao cenário nacional. A bacia do Rio São Francisco, que segundo o IBGE (2010) abrange 521 munícipios, com uma população de mais de 12 milhões de habitantes, já apresenta problemas no que diz respeito à preservação dos recursos naturais por conta das atividades econômicas exercidas nela. De acordo com o Plano Decenal de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco (2013) as principais fontes de poluição são as atividades agropecuárias, os esgotos domésticos e a mineração; além disso a agricultura irrigada consome cerca de 80% da vazão da bacia, o que gera conflitos entre os diferentes usos da água (SOARES, 2013). Outro ponto, é a lista de impactos negativos identificados pelo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) que nos revela tanto impactos ambientais como a redução da biodiversidade das comunidades biológicas aquáticas nativas nas bacias e a modificação do regime fluvial das drenagens receptoras, quanto impactos sociais como a possibilidade de interferências com populações indígenas e a ruptura de relações socio comunitárias durante a fase de obra. Tais questões são extremamente importantes de serem abordadas em uma discussão sobre a transposição e mesmo assim não são analisadas de forma aprofundada no documentário.

            Nota-se também a imprecisão de certas informações, como por exemplo o projeto Pontal de irrigação citado, que não é dito onde ele está sendo aplicado e quem ele beneficia de fato. Esse projeto é desenvolvido pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF) situado na área rural do munícipio de Petrolina na margem esquerda do rio São Francisco. Ademais, a ausência de informações relevantes como a vazão transferida, o que ela representa com relação ao rio, a repartição de água entre os estados que essa obra vai beneficiar, quem realmente vai receber essas águas, a superfície contemplada para irrigação e o custo de utilização desse recurso, torna o documentário muito pobre do ponto de vista documental. Além disso, também não é citado no vídeo a presença das usinas hidrelétricas existentes ao longo do rio São Francisco e como o projeto de transposição pode afetar o fornecimento energético da região Nordeste. Contrapondo a visão mostrada nesse documentário, segundo Soares (2013), somente a chegada da água por si só não irá resolver todos os problemas existentes nessas localidades, é preciso um maior engajamento dos administradores públicos. Dessa maneira, a escassez da água deve ser resolvida junto com os problemas de gestão dos recursos hídricos, trabalho, reforma agrária, saúde e educação, pois do contrário, a chegada da água não irá realizar um milagre na vida dessas pessoas. Infelizmente, a corrupção no cenário político brasileiro é algo recorrente e ao se tratar de uma obra tão grande e que envolve muito dinheiro, diversos interesses pessoais são levados em consideração em detrimento do bem da população como um todo.

            Com relação aos aspectos cinematográficos do documentário, observa-se uma pobreza na edição, com a repetição de imagens e a ausência de tecnologias modernas, por exemplo, a utilização de drones, que para uma produção de 2022 seria algo normal e muito útil para melhor apreciar o porte da obra. Há também um apelo para o sensacionalismo, com a utilização de músicas dramáticas e cenas em preto e branco em certos momentos do documentário. Por fim, por apresentar uma visão limitada e extremamente promocional da Transposição do Rio São Francisco, sem entrar a fundo nos assuntos mais pertinentes do tema, esse documentário é de baixa qualidade.

Ciro BARBOSA GOMES

 

Referências

Paiva, T. (2017). Entenda a transposição do Rio São Francisco. Carta Capital. Entenda a transposição do Rio São Francisco - CartaCapital (ampproject.org)

Soares, E. (2013). Seca no nordeste e a transposição do rio São Francisco. Revista Geografias, 9(2), 75–86.  https://doi.org/10.35699/2237-549X.13362

Sousa, L. A., Pereira de Almeida, L. K., & dos Santos, P. S. A. (2018). Transposição do Rio São Francisco: A história que gera  benefícios e malefícios aos brasileiros. Revista De Estudos Interdisciplinares Do Vale Do Araguaia - REIVA, 1(01). http://reiva.emnuvens.com.br/reiva/article/view/23

A política, o direito e o desenvolvimento : um estudo sobre a transposição do rio são francisco. (2014). Revista Direito GV, 10(2), 497‑534. https://doi.org/10.1590/1808-2432201421

Alves, J. J. A., & Nascimento, S. S. do. (2009). Transposição do rio São Francisco: (des) caminhos para o semi-árido do  Nordeste brasileiro. Revista Espaço Acadêmico, 9(99), 39-45. Recuperado de  https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/7707

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). (2013, 11 juillet). Repositório do Conhecimento do Ipea : Transposição do  Rio São Francisco : análise de oportunidade do projeto. http://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/1418

Domingues, F. Com mais de 90% da transposição concluída, impactos ambientais no Rio São Francisco ainda são incertos. Globo. Com mais de 90% da transposição concluída, impactos ambientais no Rio São Francisco ainda são incertos | Desafio Natureza | G1 (globo.com)

 

Additional Info

  • Director: -
  • Producer: Emissora Jovem Pan
  • Language: Portuguese
  • Year: 2022
  • Duration (min): 55
  • Theme: Water scarcity, Irrigation & agricultural water management, Drought, Water governance, Water politics, Water and community, Supply management
  • Access: Free
  • Country: Brazil
  • Technical quality (star): Technical quality (star)
  • Academic interest (star): Academic interest (star)
  • Societal interest (star): Societal interest (star)
  • Technical quality: 2.5
  • Academic quality: 2.5
  • Social interest: 3